Petrobras poderá deixar RN em até dois anos; ‘Saída não é negativa’, diz diretor

Com o anúncio feito ao mercado sobre abertura para venda dos seus campos de exploração em terra, em águas rasas, além da estrutura logística e de refino de petróleo e gás no Rio Grande do Norte, a Petrobras anunciou praticamente a saída do estado, na noite da última segunda-feira (24).

De acordo com o Roberto Ardenghy, a Petrobras vai encerrar todas suas operações de exploração de petróleo em terra para focar nas águas profundas. A explicação? A lucratividade. Ele exemplifica: um único poço na Bacia de Santos, no pré-sal, produz 50 mil barris diários de petróleo – quase o dobro do que todos os campos colocados a venda no estado, juntos, produzem diariamente.

Ele ainda ressaltou que a estatal deverá manter pelo menos dois projetos de prospecção em águas profundas, na costa potiguar, que poderão ter exploração de petróleo e gás no futuro, caso haja viabilidade. Por enquanto, os poços são apenas para análise.

Não é negativa a saída da Petrobras. A Petrobras teve um ciclo no estado, realizou projetos que foram importantes, mas agora talvez seja o momento de entrar também outras empresas, com mais dinamicidade, com mais vontade de trabalhar esses projetos menores, e ai a Petrobras vai seguir seu caminho com projetos de outras naturezas — Roberto Ardenghy, diretor de Relacionamento Institucional da Petrobras

Para o diretor, ao invés de negativa, a venda dos ativos a pequenas petrolíferas poderá voltar a alavancar o mercado de óleo e gás potiguar, com aumento da produção dos poços de exploração em terra e em águas rasas. Ele ainda afirmou que estatal está pronta a dialogar com a governadora Fátima Bezerra (PT), que afirmou que recebeu a notícia com perplexidade e indignação.

Venda

O polo colocado à venda compreende três subpolos (Canto do Amaro, Alto do Rodrigues e Ubarana), totalizando 26 concessões de produção, 23 terrestres e três marítimas, além de incluir acesso à infraestrutura de processamento, refino, logística, armazenamento, transporte e escoamento de petróleo e gás natural.

As concessões do subpolo Ubarana estão localizadas em águas rasas, entre 10 km e 22 km da costa do município de Guamaré. As demais concessões dos subpolos Canto do Amaro e Alto do Rodrigues são terrestres. Segundo a Petrobras, a produção média de janeiro a junho de 2020 foi de aproximadamente 23 mil barris de óleo por dia (bpd) e 124 mil m³/dia de gás natural.

Além das concessões e suas instalações de produção, está incluída na transação a Refinaria Clara Camarão, localizada em Guamaré, com capacidade instalada de refino de 39.600 bpd.

Confira abaixo a entrevista completa

O que significa essa venda de ativos? A Petrobras está saindo do Rio Grande do Norte?

As empresas de petróleo vivem de geologia, de resultados em termos de produção de petróleo e cada empresa tem um portfólio de negócios, tem uma quantidade de projetos que cabem na sua vocação e na sua maneira de produzir petróleo. A Petrobras, ao longo do anos, pouco a pouco, vem desenvolvendo expertise, que hoje é mundialmente reconhecida, que é tirar petróleo de águas profundas e ultraprofundas. Nós somos simplesmente os líderes mundiais nesse segmento de óleo e gás. Não é por acaso que o pré-sal é uma descoberta da Petrobras em 2006, onde tem lá uma reserva gigante de petróleo e gás natural a ser desenvolvida. Então, no alinhamento estratégico da Petrobras, atual, indica que ali é onde a gente tem a maior possibilidade de gerar rentabilidade para a empresa, para o governo federal, que é o nosso acionista controlador, e para os 300 mil acionistas. Nós temos ações vendidas em bolsa e devemos também responsabilidade perante os nossos acionistas. Então, com base nisso, a Petrobras, a partir de 2015, começou a fazer uma reorientação do seu portfólio de projetos. Isso se dá também num contexto de abertura do mercado de petróleo e gás no Brasil, onde você está abrindo oportunidade para empresas independentes também operarem no setor de petróleo e gás. A Petrobras, até hoje, acaba tendo uma posição muito monopolista, em vários segmentos desse negócio de óleo e gás, como é o caso da exploração e produção. Para você ter uma ideia, por exemplo, na Colômbia ou na Argentina, 50% da produção desses dois países é feita por empresas independentes. No Brasil, menos de 2% da produção atual está na mão das empresas pequenas e médias. Isso é ruim para a economia brasileira, porque você não tem aquele segmento de pequenas empresas gerando muito mais empregos, mais renda, mais projetos, cada um escolhendo um nicho para trabalhar. Então, ao mesmo tempo que nós estamos fazendo essa reavaliação da estratégia e nos concentrando nos projetos em águas profundas e ultraprofundas, estamos abrindo o mercado para empresas menores.

Esse é o contexto em que se dá esse desinvestimento de projetos no Nordeste, que são projetos antigos – tem projetos que começaram na década de 1960, 1970 – que já produziram muito, já tiveram um momento muito bom e agora estão em uma fase declinante. Isso quer dizer que para uma empresa do tamanho da Petrobras não faz mais sentido, porque ao mesmo tempo que somos grandes, nós temos uma estrutura de custos muito alta, como toda empresa grande. Isso faz com que a gente tenha que se concentrar em projetos maiores e abrir oportunidade para empresas mais ágeis. E aí no Rio Grande do Norte já temos dois casos. Um é o caso do Riacho da Forquilha, que foi para uma empresa chamada 3R, que hoje produz 30% a mais que a Petrobras produzia naquele campo, gerando mais emprego, mais pagamento de impostos, mais royalties, e para a economia regional é bom. Então, nós não vemos essa “saída” – entre aspas – da Petrobras do Rio Grande do Norte. Primeiro que nós não estamos saindo do Rio Grande do Norte, nós mantemos alguns projetos em ambiente marítimo: temos dois prospectos que a Petrobras está analisando, de campos de águas marítimas aí na costa do Rio Grande do Norte. Então, ao mesmo tempo que nós estamos desinvestindo em campos terrestres, em águas rasas, estamos olhando o ambiente em água profunda.

Considerando que foi anunciado ontem a venda desses ativos, vocês tem uma expectativa de quando essa venda pode ser concluída?

Normalmente, nosso processo de desinvestimento de um ativo pode durar de um a dois anos, dependendo da dinâmica. Como é que acontece na prática? A gente solta esse boletim anunciando ao mercado que esse ativo está à venda com tais e tais características. Uma série de empresas olham essa oportunidade e mandam cartas para nós, manifestando interesse. Com base nessa carta, a gente abre para essas empresas o pacote de informações dando mais detalhe sobre cada um dos campos, como eles são, qual é a geologia, quanto de petróleo ainda tem lá, qual é a estrutura logística, todas as informações de caráter técnico. As empresas analisam esse pacote de informações, realizam visitas técnicas aos ativos.

Então, essa fase que a gente chama de vinculante, demora um pouco mais, porque as empresas levam mais tempo analisando, veem a parte ambiental, veem a parte tributária, quanto paga de royalties, faz todos os cálculos, e então fazem uma oferta. Isso deve demorar cerca de oito a nove meses. É estimativa, isso. Se o preço do petróleo, por exemplo, cair muito, a gente pode desistir, deixar mais para a frente. Se subir, pode apressar, porque o nosso objetivo, claro, é obter o maior valor possível. Essa é uma sistemática aprovada pelo Tribunal de Contas da União, então a gente tem essas etapas muito estruturadas. Então, depois que as empresas que se interessaram mandam suas ofertas, a gente escolhe um grupo de três ou quatro, que são as melhores ofertas, analisa cada uma, podemos chamar todas as quatro de novo e se escolhe finalmente a vencedora da licitação. Ai se negocia o contrato, e tem o processo de transferência do ativo.

Qual é a estrutura, em relação a funcionários, vocês têm no estado e para onde ela vai ser deslocada?

Todos os nossos funcionários, que nós temos hoje no Rio Grande do Norte, que estão afetados a esses ativos, ao Pólo Pirangi, a todos eles será oferecida a possibilidade de irem trabalhar em outro projeto que a Petrobras tenha, seja um projeto de refino, seja de gás natural, seja de produção onshore, offshore, em outro lugar do Brasil. Nós temos ainda uma grande quantidade de projetos espalhados pelo Brasil e nenhum funcionário da Petrobras perderá seu emprego. Só tem que ter mobilidade. A pessoa tem que realmente se dispor a sair daí, morar em Sergipe, na Bahia, em São Paulo, no Rio de Janeiro, onde a gente necessitar do empregado. Faz parte do contrato de trabalho, essa mobilidade. Se o funcionário quiser continuar no Rio Grande do Norte, eventualmente até continuar trabalhando nesse projeto com o novo adquirente, que é uma possibilidade, ele pode entrar num programa de demissão voluntária que a gente está oferecendo também, muito interessante, um ótimo programa com um bom pacote de benefícios para a pessoa sair da empresa e ai se juntar a esse novo adquirente. São as duas possibilidades. Ou seja, ninguém vai ser demitido, não vai ter demissão em massa coisa nenhum, como tem sido dito em alguns lugares por ai.

A governadora do estado afirmou que vai entrar em contato com deputados federais e senadores do estado para buscar diálogo com a empresa e reverter essa situação. Existe volta ou esse é um projeto mais econômico que político e não tem volta para a Petrobras?

Como eu te disse. Isso faz parte de uma estratégia da empresa no sentido de se adequar aos novos tempos, até ao novo patamar do preço de petróleo. Nós, como empresa, temos obrigação de buscar maior rentabilidade, maior lucro nos projetos que a gente executa. Essa é nossa obrigação como empresa. No ano passado, a Petrobras foi a empresa que mais recolheu impostos no Brasil. Nós recolhemos R$ 248 bilhões de impostos. Então, nós damos uma contribuição importante para o desenvolvimento do Brasil pagando nossos impostos em dia, executando nossos projetos, mas a geologia é um condicionante enorme para as empresas de petróleo. Nós temos que buscar projetos onde a gente tenha rentabilidade suficiente. Para você ter ideia, todo esse pólo ai que a gente está vendendo está produzindo hoje 25 a 27 mil barris por dia, de todos os poços em todas essas concessões. Nós temos um poço do pré-sal, na bacia de Santos, que está produzindo, só um poço, 50 mil barris por dia. Um poço que produz o dobro de tudo o que a gente produz hoje no Rio Grande do Norte. Então você pergunta onde a empresa tem que concentrar seus esforços? É onde tem projetos dessa magnitude. É claro que o pré-sal é um ambiente muito desafiador, temos que botar uma unidade marítima de produção, com grande tecnologia, então isso exige muita mobilização de recursos. E esse é outro aspecto importante.

A venda desses polos não apenas gera oportunidade de novas empresas entrarem nesse segmento, como a 3R, como a Petrorecôncavo, ai no estado, que já são casos concretos. Isso tem acontecido em outros estados também, na Bahia, no Ceará, Sergipe, que a gente está vendendo esses ativos. Não é bom só para nós, que conseguimos diminuir nosso endividamento, mas também gera maior dinamicidade com novas empresas entrando. Então, nós não temos essa visão da saída da Petrobras desses projetos. E como eu disse: a gente continua olhando o offshore ai do estado. Temos dois projetos e estamos olhando. Se a gente encontrar um volume de petróleo e gás que seja interessante, a Petrobras vai desenvolver esses projetos, assim como está desenvolvendo projetos no pré-sal. Nós vamos atrás do petróleo onde ele estiver.

Essa questão da articulação política, então, não tem como fazer a empresa voltar atrás da decisão da venda desses ativos?

Olha, a decisão está tomada. Nós anunciamos. Mas estamos prontos para o diálogo. Nós mandamos uma comunicação para a governadora, explicando resumidamente qual é a motivação, e estamos abertos ao diálogo. A governadora é uma amiga da Petrobras, esteve conosco já algumas vezes falando sobre o setor de óleo e gás no estado, então não temos nenhum problema de dialogar com o governo do estado e estamos abertos à conversação, não temos nenhum problema de conversar com ela e com o secretariado do estado.

Mas o diálogo mudaria alguma coisa na decisão?

Sempre podemos conversar, ver a argumentação que o governo do estado vai trazer. Não afastamos nenhuma possibilidade. Estamos abertos a conversar.

Quando foi feito o comunicado ao governo do estado?

Foi feito de manhã (terça, 25). Nós soltamos o aviso ontem à noite (segunda, 24). Até o momento que a gente solta ao mercado, ele é confidencial, a gente não pode passar para ninguém, porque é uma informação reservada da empresa. No momento que a gente solta para o mercado é que a gente faz a comunicação oficial para os agentes públicos. Foi o que a gente fez hoje de manhã, avisando à governadora. Agora nós estamos no momento de fazer reunião com as empresas, oferecendo, dando mais detalhes sobre essa decisão e explicando a motivação, tirar um pouco essa ideia de que é uma coisa negativa, porque nós achamos e temos exemplos concretos de que isso vem em benefício à economia do estado. Não é negativa a saída da Petrobras. A Petrobras teve um ciclo no estado, realizou projetos que foram importantes, mas agora talvez seja o momento de entrar também outras empresas, com mais dinamicidade, com mais vontade de trabalhar esses projetos menores, e ai a Petrobras vai seguir seu caminho com projetos de outras naturezas.

O sindicato dos petroleiros tem uma preocupação com a situação ambiental. Algumas pessoas dizem que a Petrobras tem uma responsabilidade grande em relação à conservação e proteção ambiental, especialmente pelo risco da atividade, e que essas empresas menores não têm capacidade. Vocês concordam com isso?

Não é verdade. Os compromissos e a legislação ambiental são tão rigorosos para a Petrobras quanto para qualquer empresa que opere no Brasil. Quando uma empresa quer exercer atividade de produção de petróleo, tem que ir à ANP se credenciar como operadora, passa por um crivo do Ibama e da ANP, muito forte, para ver se a empresa tem condições de operar, toda a legislação aplicável à Petrobras é aplicável a essas empresas. Não há nenhum registro de diferença de tratamento ou de vazamentos, ou de coisas por conta dessas empresas. Não é pelo fato de elas serem menores, que elas não tenham essa preocupação e responsabilidade. Então, a gente não vê que só a Petrobras tem condição de fazer. A regulação serve para todo mundo e todo mundo tem que cumprir fielmente como é.

Vocês acreditam que essa venda possa ser a uma empresa única ou várias empresas vão se interessar?

Pode ser que aconteça um consórcio, porque esse projeto ai do Rio Grande do Norte é especialmente atrativo, e isso é uma coisa muito positiva para o estado, é de que ele tem tanto campos produtores em terra, que são essas 23 concessões, três campos em águas rasas, tem toda a estrutura de escoamento, tem a estrutura da área industrial de Guamaré e tem a refinaria Clara Camarão, com as unidades de tratamento, etc. Então é um projeto muito estruturado. Por isso a Petrobras teve preocupação de vender de maneira estruturada, porque faz muito sentido para uma empresa, ou um grupo de empresas, entrar. E a grande vantagem desse tipo de projeto é que a empresa, ao entrar, já tem possibilidade de fluxo de caixa porque já tem produção, ao contrário de você obter concessão, e ainda descobrir petróleo, fazer o projeto, perfurar o poço.

O projeto que a gente está oferecendo é um projeto já em produção. Então, é uma questão dessa empresa voltar a esses poços, repotencializar esses poços, trabalhar para aumentar a produção, como é o caso da 3R, que mencionei, no Riacho da Forquilha, que está produzindo 30% a mais do que produzia na época da Petrobras. O que eles fizeram? Voltaram aos poços, fizeram um trabalho de estimulação e hoje estão produzindo 30% mais de petróleo e gás, gerando mais ICMS, mais royalties. E a vantagem desse projeto de Pirangi é que essa empresa vai poder processar e refinar o próprio petróleo produzido na Clara Camarão. É um projeto bem interessante, e por isso a gente acha que vai vender de maneira bem favorável e vai gerar também muita atividade para a economia regional.

Você têm um valor mínimo que esses ativos vão alcançar?

Temos sim, mas não posso te dar o número. É claro que quando a gente vai oferecer ao mercado, a gente faz toda uma simulação de preço, que são controles nossos, inclusive para a gente modular, mas a gente não pode divulgar, claro, para não influenciar os eventuais ofertantes, mas nós temos estudos internos sim demonstrando a valoração desse polo.

A gente já vinha em um processo de venda de ativos no estado. Mas houve algo que acelerou esse processo?

Não. É porque a gente decidiu vender esse polo de uma maneira estruturada, porque a gente viu, como eu te disse, que existe uma sinergia. Um coisa é vender o campo, depois o gasoduto, depois a PGN, depois a Clara Camarão, depois vende a logística de Guamaré. Isso ai a gente venderia cinco ativos e talvez não tivesse tanto resultado econômico, como quando vender ele de maneira estruturada. A gente achou que foi uma maneira mais razoável do ponto de vista econômica, que a gente concentrasse tudo dentro de uma mesma estrutura. E a gente acha que dessa maneira é onde a gente vai atrair mais competição. A gente está muito esperançoso que no caso do polo Pirangi a gente vai ter uma competição entre empresas interessadas.

Esse processo é só no Rio Grande do Norte ou em outros estados também?

Não. Estamos fazendo isso na Bahia, no Ceará, Sergipe, Alagoas. A Petrobras vai sair da atividade de produção em campos terrestres. Vai ficar uma empresa mais dedicada a produção em ambiente marítimo, que é muito a tecnologia que a gente desenvolveu especialmente no pré-sal, abrindo essa oportunidade para esse grupo. Já temos ai cerca de 40 empresas, hoje, no Brasil, operando ativos que eram originalmente da Petrobras e a grande maioria com grande resultado.

Com G1-RN