Impedido pelo estatuto de se candidatar mais uma vez, Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, fará em 2020 o último ano de sua administração no São Paulo. Por um lado, o cartola precisará de uma temporada de excelência para evitar rótulos ingratos como o de “pior presidente da história tricolor” – recorrente nas redes sociais.
Por outro, é previsível que dirigentes amadores arrisquem mais para conquistar títulos em anos com eleições. Mesmo sem participar do pleito, Leco terá outra influência no processo eleitoral se finalmente vencer. Só há um enorme problema tanto para ambições pessoais quanto para o futuro do clube. As finanças não suportam mais riscos.
O blog teve acesso a um documento interno, produzido pelo departamento financeiro são-paulino, no qual estão descritos valores da temporada de 2019 – mais especificamente, o montante realizado de janeiro a outubro e a estimativa para novembro e dezembro – e as projeções para 2020. Os números são no mínimo preocupantes.
A conta fechou em 2019?
Não, não fechou. Muito longe disso. É possível que o São Paulo termine a temporada com um deficit (prejuízo) acima de R$ 180 milhões.
A diretoria acredita que o prejuízo ainda será minimizado por vendas de jogadores até 31 de dezembro de 2019. Mesmo que faltem poucos dias para o fim do ano, existe a expectativa de arrecadar R$ 80 milhões com transferências, o que reduziria o prejuízo para R$ 105 milhões.
Os motivos para as contas no vermelho são basicamente os mesmos que explicamos em outubro, com dados apresentados àquela altura do campeonato. Transferências de atletas e patrocínios ficaram abaixo da expectativa, eliminações precoces em Libertadores e Copa do Brasil prejudicaram bilheterias e direitos de transmissão.
Dentro desse prejuízo, parte considerável não precisou ser quitada já nesta temporada. O São Paulo fez acordos com credores que cobravam valores em ações judiciais – reconhecidamente, uma empresa ligada à compra de Ricardinho na década passada e a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Cerca de R$ 56 milhões foram reconhecidos como dívidas, então entraram nas despesas por motivo contábil, mas só precisarão ser pagos em parcelas ao longo dos próximos anos.
A matemática é implacável com a diretoria de Leco, no entanto. Mesmo que sejam obtidos R$ 80 milhões daqui até a virada do ano, mesmo que a ressalva sobre os acordos judiciais seja feita, o São Paulo terminará 2019 com um prejuízo muito acima do aceitável. Na melhor das hipóteses, esta terá sido uma temporada ruim para o clube.
Qual a solução para as finanças em 2020?
Leco corre o risco de entregar ao sucessor um clube em condições financeiras piores do que ele mesmo pegou – e isso não é pouco, visto que o presidente anterior a ele foi Carlos Miguel Aidar, cuja administração ficou marcada por temeridades variadas. Sendo assim, Leco produziu um orçamento com metas para lá de agressivas.
Em linhas gerais:
- O faturamento precisará aumentar em R$ 95 milhões, na comparação entre 2019 e 2020, e chegar a um total de R$ 541 milhões
- A folha salarial do futebol profissional precisará ser reduzida em R$ 40 milhões, considerando salários, direitos de imagem e de arena
- O resultado líquido terá de passar do prejuízo de possíveis R$ 180 milhões, em 2019, para um lucro de R$ 69 milhões em 2020
As projeções financeiras do São Paulo para 2019 e 2020
Em R$ milhões | 2019 (realizado/expectativa) | 2020 (expectativa) |
Receitas | 446 | 541 |
Custos | -355 | -315 |
Acordos | -56 | |
Depreciação e amortização | -107 | -128 |
Resultado financeiro | -34 | -30 |
Resultado líquido | -R$ 105 milhões (prejuízo) | R$ 69 milhões (lucro) |
A maior dificuldade para cumprir as metas impostas pela própria diretoria, para o azar do torcedor, é que o São Paulo precisará vender jovens talentos ao mesmo tempo em que terá de cortar veteranos.
Hoje o elenco são-paulino é formado por pelo menos dois perfis de jogadores. De um lado estão atletas com salários altos e pouco valor para revenda, como Alexandre Pato, Hernanes e Daniel Alves.
Do outro lado, estão jogadores com enorme potencial para transferências, como o jovem Antony, porém com salários baixos demais para que as saídas contribuam na redução de despesas.
E a projeção para as receitas?
A redução das despesas será no mínimo desafiadora para a administração do São Paulo, em especial em relação às remunerações do futebol profissional. E a história não fica muito melhor quando o torcedor olha para as projeções do financeiro tricolor para as receitas.
Em relação aos direitos de transmissão, o futebol brasileiro acaba de ficar muito mais variável. Em outras palavras, o clube paulista precisará avançar em competições como Copa do Brasil e Libertadores, além de conseguir boa posição no Campeonato Brasileiro, para bater suas metas.
As posições necessárias para cumprir o orçamento são:
- 2º lugar no Campeonato Paulista
- 4º lugar no Campeonato Brasileiro
- Quartas de final da Copa do Brasil
- Oitavas de final da Libertadores
Caso o São Paulo não chegue a esses patamares em cada competição, deixa de arrecadar com televisão e também com as bilheterias do Morumbi. O programa de sócios-torcedores perde incentivo. Ou seja, é fundamental que o clube jogue bom futebol para cumprir as metas.
As projeções financeiras do São Paulo para 2019 e 2020
Em R$ milhões | 2019 (realizado/expectativa) | 2020 (expectativa) | Variação projetada |
Televisão | 128 | 178 | +50 |
Atletas | 178 | 160 | -18 |
Bilheterias | 39 | 53 | +14 |
Patrocínios | 21 | 41 | +20 |
Social | 34 | 37 | +3 |
Estádio | 21 | 25 | +4 |
Fornecedor de material esportivo | 9 | 17 | +8 |
Sócio-torcedor | 10 | 15 | +5 |
Licenciamentos | 6 | 8 | +2 |
Outros esportes | 0 | 7 | +7 |
TOTAL | R$ 446 milhões | R$ 541 milhões | +R$ 95 milhões |
Entre outras projeções, a administração de Leco abusa do otimismo. Patrocínios precisarão render R$ 20 milhões a mais para cumprir a meta. O contrato de materiais esportivos, atualmente com a Adidas, precisará render R$ 8 milhões a mais do que nesta temporada. Jogadores vendidos terão de proporcionar ao clube R$ 160 milhões, quantia agressiva mesmo para um histórico bom vendedor como é o São Paulo.
A história que o orçamento conta ao torcedor é: com muita paciência, tudo precisa dar muito certo para salvar 2020. Jovens atletas precisarão ser vendidos, outros veteranos terão de ser cortados, e o futebol ainda precisará ser muito bem jogado. Só assim para que receitas aumentem e sejam convertidas em lucro. Caso contrário, as dívidas, que não são poucas até onde sabemos, continuarão a ser acumuladas.
Leco teve tempo para organizar as finanças são-paulinas. Se tivesse reduzido custos, produzido lucros operacionais e usado esse dinheiro para diminuir o endividamento, o clube entraria em 2020, no seu último ano de administração, com estrutura para brigar por títulos de maneira saudável. A opção foi claramente outra. O presidente tratou toda temporada como se fosse a última. E agora corre o risco de entregar um São Paulo em apuros – mesmo que vença alguma coisa.
Com GE